Nos últimos anos, muitos países têm olhado para o mercado de carbono e para a capitalização sustentável como parte da solução para a crise ambiental e climática. Isso porque, apesar das iniciativas e acordos internacionais para desacelerar os efeitos das mudanças climáticas, as emissões de gases de efeito estufa ainda seguem registrando um volume preocupante para o meio ambiente.
Nesse sentido, a menos que se alcance reduções profundas em um curto prazo, os cientistas alertam para um novo aumento de temperatura superior a 2ºC ainda no século 21. Para que os objetivos de redução sejam alcançados, é necessário, além do comprometimento das economias globais, um alto fluxo financeiro para financiar a transição para uma economia mais sustentável e minimizar a crise climática.
Dito isso, a construção de um mercado de carbono foi introduzida justamente como uma das estratégias para controlar a crise climática, colocando efetivamente um preço na poluição e emissão de gases poluentes, além de criar um incentivo econômico para que os países reduzam as emissões nocivas ao meio ambiente.
Até porque, é exatamente pela ausência de suporte financeiro que muitas nações estão ficando aquém dos objetivos climáticos a serem alcançados até 2030, conforme estabelece o Acordo de Paris e, mais recentemente, os compromissos assumidos na COP27, a conferência anual do clima da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em novembro de 2022.
Por isso, a promoção de um mercado de carbono passou a ser um dos temas mais discutidos nos últimos tempos no cenário internacional, somando o interesse econômico com a preocupação global em agir em prol da sustentabilidade. Daí a sua importância para o futuro do planeta e da resiliência da economia global.
Portanto, nada melhor do que entender como o mercado de carbono está estruturado e como ele funciona. Até porque, somente com um olhar mais atento não só de governos e empresas, mas também da sociedade como um todo, será possível que todos deem a sua contribuição no combate à crise climática.
Como surgiu o conceito?
Embora sua notoriedade seja mais recente, a semente para criação do mercado de carbono foi plantada na ocorrência do que hoje se conhece por COP, durante a ECO-92, evento realizado, em 1992, na Cidade do Rio de Janeiro.
Cinco anos depois, com a assinatura do protocolo de Quioto, ficou decidido que os países signatários desse documento deveriam assumir compromissos mais rigorosos a fim de atenuar o lançamento na atmosfera de gases causadores de efeito estufa.
Dava-se, desse modo, mais um passo em direção à implementação do mercado de carbono como hoje é conhecido. Contudo, para passar a vigorar, esse protocolo deveria reunir 55% dos países que respondessem por 55% das emissões mundiais de gases nocivos. A saber, isso só ocorreu em novembro de 2004, depois que a Rússia ratificou o documento.
Foi dessa forma que a diminuição das emissões de gases que provocam o efeito estufa passou a ter um valor econômico, o chamado crédito de carbono. Dessa forma, os países teriam um incentivo financeiro para limitar ou reduzir as emissões nocivas ao meio ambiente, o que foi mais uma vez legitimado pelo Acordo de Paris em 2015 e subsequentemente pelas conferências do clima anuais promovidas pela ONU.
Como funciona o mercado de carbono?
Conforme mencionado, a precificação, ou seja, a unidade básica do mercado de carbono é o crédito de carbono, que equivale, conceitualmente, a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2), o principal gás gerador de efeito estufa. Porém, a redução de outros gases, que igualmente são capazes de gerar o efeito estufa, também pode ser transformada em créditos de carbono, utilizando-se para isso, o conceito de carbono equivalente.
Assim, o mercado de carbono se estrutura a partir da compra e venda desses créditos. Essa negociação pode envolver organizações governamentais, bem como empresas privadas que trabalham com metas relacionadas a soluções climáticas e redução de emissões. Por exemplo, o comércio de emissões acontece quando um país que atinge a sua cota de emissões além do limite permitido e recomendado busca comprar créditos de carbono daqueles que estejam com níveis de emissão abaixo do limite estabelecido.
Ao mesmo tempo, a precificação do mercado de carbono também tem a capacidade de canalizar a demanda de investidores e consumidores para produtos e serviços que emitem menos gases de efeito estufa. Dessa forma, isso estimula a aplicação de recursos em projetos e tecnologias mais verdes. Nesse contexto, por exemplo, se enquadram projetos de fontes de energia solar ou iniciativas de conservação florestal.
No Brasil, a regulação desse mercado ainda tramita na Câmara dos Deputados, por meio do projeto de lei 528/21, que propõe a instituição do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), ainda sem previsão para votação.
Tipos de mercado de carbono
Basicamente, são dois os tipos de mercado de carbono: de conformidade e voluntário. O primeiro, também conhecido como mercado regulado, surge como resultado de qualquer política ou exigência regulatória seja em âmbito nacional, regional e/ou internacional. Esse é regido pelo Protocolo de Quioto, no qual os países comprometidos com o tratado têm obrigação de cumprir as metas de emissão estabelecidas.
Já o mercado de carbono voluntário, que pode ser nacional ou internacional, como a própria denominação específica, refere-se à emissão e negociação de créditos de carbono de forma espontânea.
Vale destacar que a oferta atual de créditos voluntários de carbono é oriunda principalmente de organizações privadas que criam projetos de carbono, ou governos que formatam programas certificados por padrões de carbono que geram reduções e/ou remoções de emissões.
A demanda do mercado de carbono voluntário vem, por sua vez, de particulares que desejam compensar suas respectivas pegadas de carbono, a exemplo de corporações com metas de sustentabilidade e aqueles que visam vender créditos a um preço mais alto para obter lucro.
Por que esse mercado é importante?
O mercado de carbono pode ser considerado importante para o futuro do planeta e da humanidade por uma série de razões. As principais são:
- O mercado de carbono permite que países obtenham receita tomando medidas apropriadas para minimizar a poluição, reduzir as emissões de carbono e limitar o aumento da temperatura global;
- Esse mercado também se destaca por focar no envolvimento voluntário das empresas para declarar seus compromissos, planos de ação e medidas tomadas para controlar as emissões;
- Permite que as indústrias verdes e energeticamente eficientes aumentem seus ganhos por meio do comércio de créditos de carbono, aumentando a lucratividade. Isso as ajudará a financiar mais projetos de transformação climática.
Principais desafios do mercado de carbono
Apesar do progresso no sentido de acordar processos e metodologias que os países precisam seguir para acessar o mercado de carbono, ainda há muitas oportunidades e uma série de preocupações que podem atrapalhar o desenvolvimento desse mercado. Questões relacionadas à contagem dupla de reduções de emissões de gases de efeito estufa; abusos dos direitos humanos, desrespeito de povos indígenas e comunidades locais; e práticas de greenwashing são alguns dos pontos que prejudicam a credibilidade e sustentabilidade de um comércio de créditos de carbono.
Dessa maneira, para que os mercados sustentáveis obtenham sucesso, além dessas questões, existem questões também questões voltadas à governança e jurisdição das normas regulatórias que não podem ser ignoradas pelas autoridades. Entre elas, destacam-se:
- Falta de consciência e clareza sobre os diferentes ativos de carbono, muitas vezes resultando em expectativas de preços irracionais;
- Dúvidas sobre a eficiência do mercado de carbono, pois algumas empresas apenas compram créditos, sem fazer nenhuma tentativa de reduzir suas próprias emissões;
- Ofertas de créditos de má qualidade;
- Definição de requisitos nos diferentes países em relação à governança e regulamentações básicas no sentido de incentivar a participação voluntária no mercado de carbono.
O mercado de crédito de carbono em números
Diante do número de empresas e pessoas da sociedade civil cada vez mais engajadas em causas ambientais, o mercado de carbono, aos poucos, vem se revelando promissor.
Segundo analistas da consultoria global Refinitiv, o valor dos mercados globais negociados para licenças de CO2 em 2021 cresceu 164% na comparação com o ano anterior, alcançando a cifra de 760 bilhões de euros, ou o equivalente a quase US$ 800 bilhões.
Ainda de acordo com o relatório por eles publicado, o Anual Carbon Market Year in Review (Revisão Anual do Mercado de Carbono, na tradução direta), a maior parte do aumento veio do Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (EU ETS), lançado em 2005, que é, até então, o mercado de carbono mais estabelecido do mundo. Esse sistema respondeu por 90% do valor global de 683 bilhões de euros, quase US$ 719 bilhões.
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